Num desses bate-papos qualquer, deparei-me com o assunto “atendimento
ao consumidor”, e coloquei-me a pensar sobre o assunto. E vieram diversos
assuntos e histórias decorrentes desse tema. Mas, além de ver o lado do
cliente/ freguês, devemos ver a questão do “atendimento” em si que, em muitas
vezes, peca.
Já vivi atrás do balcão e também do outro lado dele. Talvez seja por isso que pensei, junto com o Anderson, no nome do blog “Balcão da
Arte”. Mas enfim , hoje senti a “fome” de contar sobre algo que me aconteceu há
anos atrás...
Meu pai passou numa papelaria próxima daqui para comprar algo
e viu uma notícia que achou muito interessante. Ao voltar em casa, comentou o
assunto com minha mãe. Ambos me chamaram para conversar e me perguntaram:
- Você quer trabalhar e ter o seu próprio dinheiro para
gastar, filha?
Eu, ainda com os meus quatorze anos, pensei por um instante
e dei-lhes a resposta no mesmo momento. Então, voltei com a minha mãe ao tal local
para conversar com os donos dessa loja e saber mais detalhes sobre o serviço. E
logo em seguida, comecei o atendimento aos “fregueses”, como meu patrão os
chamava.
Os dias foram se passando. As experiências foram se
acumulando. Um atendimento daqui, outro dali. O patrão exigia contas no papel,
enquanto eu já calculava rapidamente de cabeça. A patroa ensinava a arrumar as
prateleira, bem como a atender o cliente. O patrão reparava até no chão
varrido para ver se encontrava algum objeto minúsculo caído no chão e afirmava
quando encontrava:
- Esse clipes no chão é dinheiro jogado fora. Guarde-o aqui nesse
pote, pois nós o utilizaremos depois.
Ou senão dizia ao encontrar folhas amassadas:
- Cuidado ao colocar as folhas no seu lugar de volta. Se
amassar, não conseguiremos vender. Se não vendermos, não ganhamos e, também,
não temos dinheiro para fazer o seu pagamento.
Além disso, eles observavam nosso atendimento, e quando
achavam necessário, nos chamavam no canto para dizer:
- Mesmo a gente achando que o freguês está errado, na
verdade ele sempre está certo. Ele está sempre certo porque dependemos dele
para ganhar o nosso dinheiro para vivermos, porque dependemos dele para manter
essa loja e também pagamos o seu salário, e nós não queremos perdê-los!
Durante a volta às aulas, a loja sempre enchia. E eles,
enquanto atendiam, também nos observavam, e sempre cobravam que déssemos atenção
exclusivamente aquele que chegasse primeiro, independente do que queriam.
Esses ensinamentos aprendidos perduraram por quase 3 anos.
Eu saia da escola de manhã, ia para casa almoçar e depois retornava, pois era
próximo da escola. Depois comecei a estudar a noite, e colocaram-me para
trabalhar de manhã. Depois voltei a estudar de manhã, mas já não dava para
trocar o horário de novo na loja. Depois de um ano fora da loja, eles me convidaram para ajudá-los no período de “voltas às aulas” porque
precisavam de mais balconista, mas não tinham mais tempo para treinar, e como
eu já era bem treinada, podia quebrar o galho deles e ganhar um dinheirinho
extra também. Com esse convite carinhoso que recebi, voltei, Voltei e fiquei mais uns dois ou três meses trabalhando com eles.
Enfim, eu vivi essa situação durante anos. Aprendi com meus
patrões, muita coisa. Mas além de aprender, também tínhamos nossos momentos de
descontração.
Anos mais tarde, eu resolvi fazer uma graduação. Nesse curso
estudado, percebi que meus patrões estavam certos ao ensinar sobre o “atendimento
individualizado”, o jeito de “lidar com as reclamações de maneira sutil,
permitindo com que o cliente ficasse satisfeito e voltasse sempre” e, também,
percebi que eles exigiam que “déssemos atenção a nosso cliente”.
Hoje em dia, vemos
muitas reclamações, em diversas esferas, sobre empresas, comércios, espaços
culturais, grupos teatrais que pecam no atendimento ao seu cliente. Talvez, essas pessoas
devessem ter trabalhado com meus patrões e estudado sobre o assunto para
entender, repensar e analisar a premissa de que o “freguês* tem sempre razão” e que o seu atendimento deve ser melhorado!
*Entende-se por cliente/ freguês pessoas que compram ou adquirem algum serviço, seja ele comprador, frequentador, espectador etc.
Joyce C. L. Gomes
05 de outubro de 2013